segunda-feira, 15 de abril de 2013

Carnaval, Origens e Relatos Históricos

Carnaval - a Festa da Carn

“...se viverdes segundo a carne, morrereis; 

mas, se pelo Espírito mortificardes as obras do corpo, vivereis” 

(Rm 8.13)

O carnaval brasileiro é uma das festas populares mais conhecidas em todo o mundo, mas totalmente contrária aos valores cristãos bíblicos. Mesmo sendo uma manifestação cultural popular, deve ser analisada à Luz da Bíblia Sagrada por aqueles que pretendem trilhar os ensinos de Jesus Cristo e do Evangelho. E é analisando os registros históricos desde os primórdios dos tempos, que  podemos discernir melhor o que realmente envolve esse conceito de "festa popular". 

Origem histórica da festa do rei Momo
*A palavra carnaval deriva da expressão latina carne levare, que significa abstenção da carne. Este termo começou a circular por volta dos séculos XI e XII para designar a véspera da quarta-feira de cinzas, dia em que se inicia a exigência da abstenção de carne, ou jejum quaresmal. Comumente os autores explicam este nome a partir dos termos do latim tardio carne vale, isto é, adeus carne, ou despedida da carne; esta derivação indicaria que no carnaval o consumo de carne era considerado lícito pela última vez antes dos dias do jejum quaresmal - outros estudiosos recorrem à expressão carnem levare, suspender ou retirar a carne: o Papa São Gregório Magno teria dado ao último domingo antes da quaresma, ou seja, ao domingo da qüinquagésima, o título de dominica ad carnes levandas; a expressão haveria sido sucessivamente abreviada para carnes levandas, carne levamen, carne levale, carneval ou carnaval – um terceiro grupo de etmologistas apela para as origens pagãs do carnaval: entre os gregos e romanos costumava-se exibir um préstito em forma de nave dedicada ao deus Dionísio ou Baco, préstito ao qual em latim se dava o nome de currus navalis: de onde vem a forma carnavale. Segundo o historiador José Carlos Sebe, ao carnaval estão relacionadas às festas e manifestações populares dos mais diversos povos, tais como o purim, judaico, e as saturnálias e as caecas, babilônicas, manifestações que contribuíram muito para o carnaval atual.
A real origem do carnaval é um tanto obscura. Alguns historiadores assentam sua procedência sobre as festas populares em honra aos deuses pagãos Baco e Saturno. Em Roma, realizavam-se comemorações em homenagem a Baco (deus de origem grega conhecido como Dionísio e responsável pela fertilidade. Era também o deus do vinho e da embriaguez).
As famosas bacanais eram festas acompanhadas de muito vinho e orgias, e também caracterizadas pela alegria descabida, eliminação da repressão e da censura e liberdade de atitudes críticas e eróticas. Outros estudiosos afirmam que o carnaval tenha sido, talvez, derivado das alegres festas do Egito, que celebravam culto à deusa Isís e ao deus Osíris, por volta de 2000 a.C.
A Enciclopédia Britânnica afirma: Antigamente o carnaval era realizado a partir da décima segunda noite e estendia-se até a meia-noite da terça-feira de carnaval. Outra corrente de pensamento entende que o carnaval teve sua origem em Roma. Enquanto alguns papas lutaram para acabar com esta festa (Clemente, séculos IX e XI, e Benedito, século XIII), outros, no entanto, a patrocinavam. A ligação desta festa com o povo romano tornou-se tão sólida que a Igreja Romana preferiu, ao invés de suspendê-la, dar-lhe uma característica católica. Ao olharmos para países como Itália, Espanha e França, vemos fortes denominadores comuns do carnaval em suas culturas. Estes países sofreram grandes influências romanas. O antigo Rei das Saturnais, o mestre da folia, é sempre morto no final das antigas festas pagãs.  Vale ressaltar que O festival Dionisíaco expõe em seu tema um grande contra-senso, descrito na The Grolier Multimedia. Enciclopédia, 1997: A adoração neste festival é chamada de Sparagmos, caracterizada por orgias, êxtase e fervor ou entusiasmo religioso. No entanto, seu significado é descrito no mesmo parágrafo da seguinte forma: Deixar de lado a vida animal, a comida dessa carne e a bebida desse sangue.
A origem do carnaval no Brasil
O primeiro baile de carnaval realizado no Brasil ocorreu em 22 de janeiro de 1841, na cidade do Rio de Janeiro, no Hotel Itália, localizado no antigo Largo do Rócio, hoje Praça Tiradentes, por iniciativa de seus proprietários, italianos empolgados com o sucesso dos grandes bailes mascarados da Europa. Essa iniciativa agradou tanto que muitos bailes o seguiram. Entretanto, em 1834, o gosto pelas máscaras já era acentuado no país por causa da influência francesa. Ao contrário do que se imagina, a origem do carnaval brasileiro é totalmente européia, sendo uma herança do entrudo português e das mascaradas italianas. Somente muitos anos depois, no início do século XX, foram acrescentados os elementos africanos, que contribuíram de forma definitiva para o seu desenvolvimento e originalidade.
Nessa época, o carnaval era muito diferente do que temos hoje. Era conhecido como entrudo, festa violenta, na qual as pessoas guerreavam nas ruas, atirando água uma nas outras, através de bisnagas, farinha, pós de todos os tipos, cal, limões, laranjas podres e até mesmo urina. Quando toda esta selvageria tornou-se mais social, começou então a se usar água perfumada, vinagre, vinho ou groselha; mas sempre com a intenção de molhar ou sujar os adversários, ou qualquer passante desavisado. Esta brincadeira perdurou por longos anos, apesar de todos os protestos. Chegou até mesmo a alcançar o período da República. Sua morte definitiva só foi decretada com o surgimento de formas menos hostis e mais civilizadas de brincar, tais como o confete, a serpentina e o lança-perfume. Foi então que o povo trocou as ruas pelos bailes.
Símbolos carnavalescos
Como em qualquer manifestação popular, o carnaval também se utilizou de formas simbólicas para aguçar a criatividade do povo e, conseqüentemente, perpetuar sua história. As fantasias apareceram logo após as máscaras, por volta de 1835, dando um colorido todo especial à festa. Com o passar dos anos, as pessoas iam perdendo a inibição e as fantasias, que a princípio eram usadas como disfarce (por serem quentes demais), foram dando lugar a trajes cada vez mais leves, chegando ao nível que vemos hoje, de quase completa nudez. Independente das mudanças, os grandes bailes, portanto, permaneceram realizando concursos de fantasias, incentivando a competição entre grandes figurinistas e modelos. Como já foi citado, o primeiro baile de carnaval no Brasil foi realizado em 1841, na cidade do Rio de Janeiro, e, desde então, não parou mais. No começo eram apenas bailes de máscaras e a música era a polca, a valsa e o tango. Havia também coros de vozes para animar a festa. Nota-se que nem sempre foi tocado o samba, mas modinhas. Os escravos contribuíram com o carnaval com um estilo de música chamado lundu, ritmo trazido de Angola. Tal ritmo, no entanto, por ser considerado indecente, limitava-se apenas às senzalas. Contudo, permaneceu durante todo o século XIX. Com esta fusão de ritmos nasce o samba, uma expressão do dialeto africano quibundo. Essa expressão passou por uma culturação e se tornou o que chamamos hoje de samba. O samba se popularizou nos entrudos, pois em sua origem este ritmo não era propriamente música, mas uma dança feita nos quilombos. Todo este contexto histórico nos leva até os anos 20, ocasião em que nasce aquilo que hoje é chamado de a excelência do samba, ou seja, o samba de enredo. O carnaval hoje conta com bailes de todos os tipos, como o baile à fantasia, baile da terceira idade, matinês para crianças, bailes de travestis, entre outros. Os embalos musicais destes bailes contam com o bater dos surdos e o samba é o ritmo predominante. Também se toca axé music, um estilo baiano. No carnaval hoje não se dança mais, pula-se.
Desfiles das Escolas de Samba
Iniciou-se no começo do século XX com os blocos, mas somente nos anos 60 e 70 é que acontece no carnaval brasileiro a chamada Revolução Plástica, com a participação da classe média na folia e todos os seus valores estéticos e estilísticos, que viriam incrementar todo o contexto das escolas de samba. Os desfiles das escolas de samba são, sem dúvida, o ponto alto do carnaval brasileiro, turistas vêem de todos os cantos e pagam pequenas fortunas para assistirem ao desfile. Outras tantas pessoas perdem noites de sono vendo a festa pela televisão. A competição entre as escolas de samba é ferrenha, e não raro ocorrem brigas entre seus líderes (leia-se presidentes) durante a apuração dos resultados, pois os pontos são disputados um a um, para que, ao final, se saiba quem foi a grande campeã do carnaval. Um detalhe importante. A oficialização do desfile das escolas aconteceu em 1935, com a fundação do Grêmio Recreativo Escola de Samba. Antes desta data, porém, mais precisamente em 1930, já se via desfiles nas ruas do Rio de Janeiro.
O carnaval e a igreja católica romana
Devido à sua origem pagã, e pelo fato de ser uma festa um tanto obsceno, a relação entre a Igreja Romana e o carnaval nunca foi amigável. No entanto, o que prevaleceu por parte da igreja foi uma atitude de tolerância quanto à essa manifestação, até porque a liderança da igreja não conseguiu eliminá-la do calendário. A solução, então, foi: se não pode vencê-los, junte-se a eles. Daí, no século XV, a festa da carne, por assim dizer, foi incorporada ao calendário da igreja, sendo oficializado como a festa que antecede a abstinência de carne requerida pela quaresma: Por fim, as autoridades eclesiásticas conseguiram restringir a celebração oficial do carnaval aos três dias que precedem a quarta-feira de cinzas (em nossos tempos, alguns párocos bem intencionados promovem, dentro das normas cristãs, folguedos públicos nesse tríduo a fim de evitar que sejam os fiéis seduzidos por divertimentos pouco dignos). Como se vê, a igreja não instituiu o carnaval; teve, porém, de o reconhecer como fenômeno vigente no mundo em que ela se implantou. Sendo em si suscetível de interpretação cristã, ela o procurou subordinar aos princípios do Evangelho; era inevitável, porém, que os povos não sempre observassem o limite entre o que o carnaval pode ter de cristão e o que tem de pagão. Esta claro que são contrários às intenções da igreja os desmandos assim verificados. Em reparação dos mesmos foram instituídas adoração das quarenta horas e as práticas de retiros espirituais nos dias anteriores à quarta-feira de cinzas.
José Carlos Sebe escreveu: Apenas no século XV, provavelmente movido pelo sucesso popular da festa, o Papa Paulo II a incorporou no calendário cristão. Aliás, Paulo II foi mais longe, chegando a patrocinar toda uma rica celebração antes do advento da Quaresma. Não apenas o carnaval popular foi organizado pelos papas. Paulo IV promoveu uma terça-feira gorda, um lauto jantar onde compareceu o sacro colégio romano, e o festim regado a vinho pôde ser considerado uma das primitivas celebrações em salão fechado. A tentativa da Igreja Católica Romana na cristianização do carnaval e sua atual justificativa é totalmente inconseqüente, infeliz e irresponsável. Não existe uma referência bíblica sequer favorável ao seu argumento.
Pelo contrário. Existe todo um contexto bíblico explicitamente contrário à essa manifestação popular. Todos os especialistas cristãos sabem muito bem quando devem aplicar a transculturação cristã em determinada manifestação cultural (como exemplo, o Natal, período em que ocorre a mudança do objeto de culto e a extirpação total da velha ordem, transformação das simbologias e referências). Sabem também quando à determinada comemoração popular é impossível aplicar quaisquer processos de cristianização.
O carnaval é um exemplo real da sobrevivência do paganismo, com todos os seus elementos presentes. É a explicita manifestação das obras da carne:
“Porque as obras da carne são manifestas, as quais são: adultério, prostituição, impureza, lascívia, Idolatria, feitiçaria, inimizades, porfias, emulações, iras, pelejas, dissensões, heresias, Invejas, homicídios, bebedices, glutonarias, e coisas semelhantes a estas, acerca das quais vos declaro, como já antes vos disse, que os que cometem tais coisas não herdarão o reino de Deus” (Gl 5.19-21 - ACF)
*O apóstolo Paulo declara que os que cometem tais coisas não herdarão o reino de Deus (Gl 5.19-21).
Posição da igreja evangélica no período do carnaval
Como pudemos observar, o carnaval tem sua origem em rituais pagãos de adoração a deuses falsos. Trata-se, por isso, de uma manifestação popular eivada de obras da carne, condenadas claramente pelas Sagradas Escrituras. Seja no Egito, Grécia ou Roma antiga, onde se cultua, respectivamente, os deuses Osíris, Baco ou Saturno, ou hoje em São Paulo, Recife, Porto Alegre ou Rio de Janeiro, sempre notaremos bebedeiras desenfreadas, danças sensuais, música lasciva, nudez, liberdade sexual e falta de compromisso com as autoridades civis e religiosas. Entretanto, não podemos também deixar de abordar os chamados benefícios do carnaval ao país, tais como geração de empregos, entrada de recursos financeiros do exterior através do turismo, aumento das vendas no comércio, entre outros.
Traçando o perfil do século XXI, não é possível isentar a igreja evangélica deste momento histórico. Então, qual deve ser a posição do cristão diante do carnaval? Devemos sair de cena para um retiro espiritual, conforme o costume de muitas igrejas, a fim de não sermos participantes com eles (Ef 5.7)? Devemos, por outro lado, ficar aqui e aproveitarmos a oportunidade para a evangelização? Ou isso não vale à pena porque, especialmente neste período, o deus deste século lhes cegou o entendimento (2Co 4.4) ?
Creio que a resposta cabe a cada um. Mas, por outro lado, a personalidade da igreja nasce de princípios estreitamente ligados ao seu propósito: fazer conhecido ao mundo um Deus que, dentre muitos atributos, é Santo.
José Carlos Sebe, no livro Carnaval de Carnavais, página 16, descreve, segundo George Dúmezil (estudioso das tradições mitológicas): O carnaval deve ser considerado sagrado, porque é a negação da rotina diária. Ou seja, é uma oportunidade única para extravasar os desejos da carne, e dentro deste contexto festivo, isto é sagrado, em nada pervertido.
Na página 17, o mesmo autor descreve: Beber era um recurso lógico para a liberação pessoal e coletiva. A alteração da rotina diária exigia que além da variação alimentar, também o disfarce acompanhasse as transformações.
Observe ainda o que diz Manuel Gutiérez Estéves: No passado, faziam-se nos povoados, mas sobretudo nas cidades, diversos tipos de reuniões em que todos os participantes aparentavam algo diferente daquilo que, na realidade, eram. A pregação eclesiástica inseriu na mensagem estereotipada do carnaval a combinação extremada da luxúria com a gula. Não falta, sem dúvida, fundamento para isto.
. Como cristãos, não podemos concordar e muito menos participar de tal comemoração, que vai contra os princípios claros da Palavra de Deus.
Curiosidades do carnaval
As armas da festa - Confete - Procedente da Espanha, veio para o Brasil em 1892; Serpentina. De origem francesa, chega ao país também em 1892; Lança-perfume - Bisnaga de vidro ou metal (hoje feita de plástico), que continha éter perfumado. De origem francesa, chegou ao Brasil em 1903.
O rei momo no carnaval carioca
De origem greco-romana, Momo é a figura mais tradicional do carnaval. Segundo consta a lenda, ele foi expulso do Olimpo, habitação dos deuses, por causa de sua irreverência. Nas festas de homenagem ao deus Saturno, na antiga Roma, o mais belo soldado era escolhido para ser o rei Momo. No final das comemorações, o eleito era sacrificado a Saturno em seu altar.
O rei Momo foi introduzido no carnaval carioca em 1933. Sua figura era representada por um boneco de papelão. Em 1949, no entanto, o boneco de papelão foi substituído por personalidades importantes da época. Em 1950, esta festa popular deixou de contar apenas com a representação do rei Momo, surgindo, então, as rainhas e princesas do carnaval.
CARNAVAL
A maior festa popular brasileira
“Digo, porém: Andai em Espírito, e não cumprireis a concupiscência da carne. Porque a carne cobiça contra o Espírito, e o Espírito contra a carne; e estes opõem-se um ao outro, para que não façais o que quereis”
(Gl 5.16-17 - ACF)
Origem Histórica
Segundo definição genérica, o carnaval é uma festa popular coletiva, que foi transmitida oralmente através dos séculos, como herança das festas pagãs realizadas a 17 de dezembro (Saturnais - em honra a deus Saturno na mitologia grega.) e 15 de fevereiro (Lupercais - em honra a Deus Pã, na Roma Antiga.). Na verdade, não se sabe ao certo qual a origem do carnaval, assim como a origem do nome, que continua sendo polêmica.
Alguns estudiosos afirmam que a comemoração do carnaval tem suas raízes em alguma festa primitiva, de caráter orgíaco, realizada em honra do ressurgimento da primavera. De fato, em certos rituais agrários da Antigüidade, 10 mil anos A.C., homens e mulheres pintavam seus rostos e corpos, deixando-se enlevar pela dança, pela festa e pela embriaguez. Originariamente os católicos começavam as comemorações do carnaval em 25 de dezembro, compreendendo os festejos do Natal, do Ano Novo e de Reis, onde predominavam jogos e disfarces. Na Gália, tantos foram os excessos que Roma o proibiu por muito tempo. O papa Paulo II, no século XV, foi um dos mais tolerantes, permitindo que se realizassem comemorações na Via Lata, rua próxima ao seu palácio. Já no carnaval romano, viam-se corridas de cavalo, desfiles de carros alegóricos, brigas de confetes, corridas de corcundas, lançamentos de ovos e outros divertimentos.
O baile de máscaras, introduzido pelo papa Paulo II, adquiriu força nos séculos XV e XVI, por influência da Commedia dell'Arte. Eram sucesso na Corte de Carlos VI. Ironicamente, esse rei foi assassinado numa dessas festas fantasiado de urso.
As máscaras também eram confeccionadas para as festas religiosas como a Epifania (Dia de Reis). Em Veneza e Florença, no século XVIII, as damas elegantes da nobreza utilizavam-na como instrumento de sedução. Na França, o carnaval resistiu até mesmo à Revolução Francesa e voltou a renascer com vigor na época do Romantismo, entre 1830 e 1850. Manifestação artística onde prevalecia a ordem e a elegância, com seus bailes e desfiles alegóricos, o carnaval europeu iria desaparecer aos poucos na Europa, em fins do século XIX e começo do século XX. Há que se registrar, entretanto, que as tradições momescas ainda mantêm-se vivas em algumas cidades européias, como Nice, Veneza e Munique.
Etmologia da Palavra
Assim como a origem do carnaval, as raízes do termo também têm se constituído em objeto de discussão. Para uns, o vocábulo advém da expressão latina "carrum novalis" (carro naval), uma espécie de carro alegórico em forma de barco, com o qual os romanos inauguravam suas comemorações. Apesar de ser foneticamente aceitável, a expressão é refutada por diversos pesquisadores, sob a alegação de que esta não possui fundamento histórico. Para outros, a palavra seria derivada da expressão do latim "carnem levare", modificada depois para "carne, vale !" (adeus, carne!), palavra originada entre os séculos XI e XII que designava a quarta-feira de cinzas e anunciava a supressão da carne devido à Quaresma. Provavelmente vem também daí a denominação "Dias Gordos", onde a ordem é transgredida e os abusos tolerados, em contraposição ao jejum e à abstenção total do período vindouro (Dias Magros da Quaresma).
Posição da igreja evangélica no período do carnaval
Como pudemos observar, o carnaval tem sua origem em rituais pagãos de adoração a deuses falsos. Trata-se, por, isso de uma manifestação popular eivada de obras da carne, condenadas claramente pela Bíblia. Seja no Egito, Grécia ou antiga Roma, onde se cultua, respectivamente, os deuses Osíris, Baco ou Saturno, ou hoje em São Paulo, Recife, Porto Alegre ou Rio de Janeiro, sempre notaremos bebedeira desenfreada, danças sensuais, música lasciva, nudez, liberdade sexual e falta de compromisso com as autoridades civis e religiosas.
Traçando o perfil do século XXI, não é possível isentar a Igreja evangélica deste movimento histórico. Então qual deve ser a posição do cristão diante do carnaval? Devemos sair de cena para um retiro espiritual, conforme o costume de muitas igrejas? Devemos por outro lado, ficar aqui e aproveitarmos a oportunidade para a evangelização? Ou isso não vale a pena porque, especialmente neste período, o deus deste século lhes cegou o entendimento?
*Cremos que a resposta cabe a cada um. Mas, por outro lado, a personalidade da Igreja de Deus nasce de princípios estreitamente ligados ao seu propósito: fazer conhecido ao mundo um Deus que, dentre muitos atributos, é santo.
Há quem justifique como estratégia evangelística a participação efetiva na festa do carnaval, desfilando com carros alegóricos e blocos evangélicos, o que não deixa de ser uma tremenda associação com a profanação. Pergunta-se, então: será que deveríamos freqüentar boates gays, sessões espíritas e casas de massagem, a fim de conhecer melhor a ação do diabo e investir contra ela? Ou deveríamos traçar estratégias melhores de evangelismo? No carnaval de hoje, são poucas as diferenças das festas que o originaram, continuamos vendo, imoralidade, promiscuidade sexual e bebedeira. Como cristãos não podemos concordar e muito menos participar de tal comemoração, que vai contra os princípios claros da Palavra de Deus cf. (Romanos 8.5-8; ICo 6.20).
“Porque os que são segundo a carne inclinam-se para as coisas da carne; mas os que são segundo o Espírito para as coisas do Espírito. Porque a inclinação da carne é morte; mas a inclinação do Espírito é vida e paz.
Porquanto a inclinação da carne é inimizade contra Deus, pois não é sujeita à lei de Deus, nem, em verdade, o pode ser. Portanto, os que estão na carne não podem agradar a Deus” (Rm 8.5-8 - ACF)
“Porque fostes comprados por bom preço; glorificai, pois, a Deus no vosso corpo, e no vosso espírito, os quais pertencem a Deus” (1Co 6.20 - ACF)
Evangelismo ou retiro espiritual?
A maioria das igrejas evangélicas hoje tem sua própria opinião quanto ao tipo de atividade que deve ser realizada no período do carnaval. Opinião, esta que, baseia-se em parte na teologia que cada uma delas prega. Este fato é que normalmente justifica sua posição. A saber: enquanto umas participam de retiros espirituais, outras, no entanto, preferem ficar na cidade durante o carnaval com o objetivo de evangelizar os foliões.
Primeiramente, gostaríamos de destacar que respeitamos as duas posições, pois cremos que os cristãos fazem tudo por amor com a intenção de ganhar almas para Cristo, edificando seu Corpo. Entendemos também o propósito dos retiros espirituais: momentos de maior comunhão com o Senhor. Muitos crentes tem sido edificados pela pregação da Palavra e atuação do Espírito Santo nos acampamentos das igrejas.
Todavia, a oportunidade de aproveitarmos o carnaval para testemunhar é pouco difundida em nosso meio.
Em meio à pressão provocada pelo mundo, a igreja deve buscar estratégicas adequadas para posicionar-se à estas mudanças dentro da Bíblia, e não dentro de movimentos contrários a ela. A Bíblia é a fonte, e não fatores externos. Cristãos de todos os lugares do Brasil possuem opinião diferente s a este respeito de maneira adequada para evangelização no período do carnaval. Mas devemos notar que Cristo nunca perdeu uma oportunidade para pregar. Partindo deste princípio não podemos deixar de levar o evangelho não importando o momento.  “Que pregues a palavra, instes a tempo e fora de tempo, redarguas, repreendas, exortes, com toda a longanimidade e doutrina” (2Tm 4.2 - ACF)
. Assim, devemos lançar mão da sabedoria que temos recebido do Senhor e optar pela melhor atividade para a nossa igreja nesse período tão sombrio que é o carnaval. A igreja jamais pode ser omissa quanto a esse assunto. O cristão deve ser sábio ao tomar sua decisão, sabendo que: “Em que noutro tempo andastes segundo o curso deste mundo, segundo o príncipe das potestades do ar, do espírito que agora opera nos filhos da desobediência. Entre os quais todos nós também antes andávamos nos desejos da nossa carne, fazendo a vontade da carne e dos pensamentos; e éramos por natureza filhos da ira, como os outros também. Mas Deus, que é riquíssimo em misericórdia, pelo seu muito amor com que nos amou, Estando nós ainda mortos em nossas ofensas, nos vivificou juntamente com Cristo (pela graça sois salvos), E nos ressuscitou juntamente com ele e nos fez assentar nos lugares celestiais, em Cristo Jesus” (Ef 2.2-6 - ACF)
*Assim devemos lançar mão da sabedoria que temos recebido do Senhor e optar pela melhor atividade para nossa igreja nesse período tão sombrio que é o carnaval.
Bibliografia:
Instituto Cristão de Pesquisa – (ICP)
Revista Defesa da Fé
Enciclopédia Barsa
SAIBA MAIS LENDO:
AS OBRAS DA CARNE - "PORQUE AS OBRAS DA CARNE são: prostituição, impurezas, lascívia, idolatria , feitiçarias, inimizades, porfias, emulações, iras, pelejas, ...

segunda-feira, 18 de fevereiro de 2013

Consolo nas aflições, sofrimentos compensados.

 

 
Por A. W. Pink. 
“Porque para mim tenho por certo que as aflições deste tempo presente não são para comparar com a glória que em nós há de ser revelada”. (Romanos 8:18)

 Ah, alguém diz, que essa passagem deve ter sido escrita por um homem que não conhecia o sofrimento, ou por alguém familiarizado com nada mais do que as leves irritações da vida. Não é isso. Estas palavras foram escritas sob a direção do Espírito Santo, e por alguém que bebeu profundamente do cálice do sofrimento, sim, por alguém que sofreu aflições em suas formas mais intensas. Veja o seu próprio testemunho: "Recebi dos judeus cinco quarentenas de açoites menos um. Três vezes fui açoitado com varas, uma vez fui apedrejado, três vezes sofri naufrágio, uma noite e um dia passei no abismo;  Em viagens muitas vezes, em perigos de rios, em perigos de salteadores, em perigos dos da minha nação, em perigos dos gentios, em perigos na cidade, em perigos no deserto, em perigos no mar, em perigos entre os falsos irmãos; Em trabalhos e fadiga, em vigílias muitas vezes, em fome e sede, em jejum muitas vezes, em frio e nudez"(2 Coríntios 11:24-27). “Porque para mim tenho por certo que as aflições deste tempo presente não são para comparar com a glória que em nós há de ser revelada”.

Esta, então foi a firme convicção, não de alguém "favorito da sorte", não de alguém que encontrou na jornada da vida um caminho atapetado, rodeado com rosas, mas, ao contrário, de alguém que foi odiado por seus parentes, que foi muitas vezes espancado, que sabia o que era ser privado não só do conforto, mas também das necessidades básicas da vida. Como, então explicar o seu alegre otimismo? Qual foi o segredo da sua dignidade sobre seus problemas e provações?

A primeira coisa com a qual o apóstolo penosamente provado consolou-se era que os sofrimentos do cristão são de curta duração - que estão limitados ao "tempo presente". Isto está em nítido e em solene contraste com sofrimentos dos que rejeitam a Cristo. Seus sofrimentos serão eternos: para sempre atormentados no Lago de Fogo. Mas muito diferente é para o crente. Seus sofrimentos são restritos a esta vida na Terra, que é comparado a uma flor que sai e é cortada, a uma sombra que foge e não permanece. Uns poucos anos no máximo, e vamos passar deste vale de lágrimas para aquele país abençoado, onde lamentos e choros nunca mais serão ouvidos.

Em segundo lugar, o apóstolo olhou além, com os olhos da fé para "a glória". Para Paulo "a glória" era algo mais do que um sonho lindo. Era uma realidade prática, exercendo uma poderosa influência sobre ele, consolando-o nas horas mais críticas e difíceis da adversidade. Este é um dos verdadeiros testes da fé. O cristão tem um sólido suporte na hora da aflição, quando o incrédulo não tem. O filho de Deus sabe que na presença do Pai "háfartura de alegrias", e que à sua mão direita "há delícias perpetuamente". E a fé se apodera deles, apropria-se deles, e vive na alegria reconfortante deles até agora. Assim como Israel no deserto foi encorajado por uma visão do que os esperava na terra prometida (Nm 13:23,26), assim, aquele que hoje caminha pela fé, e não por vista, contempla o que os olhos não viram, nem ouvidos ouviram, mas o que Deus pelo Seu Espírito Santo tem revelado a nós (1 Cor. 2:9,10).

Em terceiro lugar, o apóstolo se regozijou "com a glória que em nós há de ser revelada". Tudo isso significa que ainda não somos capazes de ter uma compreensão plena dessas coisas. Mas mais do que uma dica foi concedida a nós. Haverá:

(a) A "glória" de um corpo perfeito. Naquele dia esta corrupção se revestirá da incorruptibilidade, e isto que é mortal, da imortalidade. O que foi semeado em ignomínia será ressuscitado em glória, e o que foi semeado em fraqueza será ressuscitado em vigor. Assim como trouxemos a imagem do terreno, devemos trazer também a imagem do celestial (1 Coríntios. 15:49). O conteúdo dessas expressões é resumido e amplificado em Filipenses 3:20,21: "Mas a nossa cidade está nos céus, de onde também esperamos o Salvador, o Senhor Jesus Cristo. Que transformará o nosso corpo abatido, para ser conforme o seu corpo glorioso, segundo o seu eficaz poder de sujeitar também a si todas as coisas”.

(b) Haverá a glória de uma mente transformada. "Porque agora vemos por espelho em enigma, mas então veremos face a face; agora conheço em parte, mas então conhecerei como também sou conhecido" (1 Cor 13:12). Oh, que envolvimento de luz intelectual com que cada mente será glorificada! Que faixa de luz vai envolvê-la! Que capacidade de entendimento vai deleitá-la! Então todos os mistérios serão desvendados, todos os problemas resolvidos, todas as discrepâncias reconciliadas. Então cada verdade da revelação de Deus, cada evento de Sua providência, cada decisão de seu governo, ficará ainda mais transparentemente clara e resplandecente como o próprio sol. Você, em sua busca presente pelo conhecimento espiritual, lamenta a escuridão da sua mente, a fraqueza de sua memória, as limitações de suas faculdades intelectuais? Então nos regozijemos na esperança da glória que está para ser revelada em você - quando todos os seus poderes intelectuais serão renovados, desenvolvidos, aperfeiçoados, de modo que você conhecerá como você é conhecido.

(c) Melhor de tudo, haverá a glória da santidade perfeita. A obra da graça de Deus em nós, então, será completada. Ele prometeu que aperfeiçoará "o que me toca" (Salmo 138:8). Então será a consumação de pureza. Fomos predestinados para sermos "conformes à imagem de Seu Filho" (Rm 8:29), e quando O veremos "seremos semelhantes a ele" (1 João 3:2). Então, nossas mentes não serão mais contaminadas por imaginações do mal, nossas consciências não serão mais manchadas por um sentimento de culpa, nossas afeições não serão mais enganadas por objetos indignos. Que perspectiva maravilhosa é esta! A "glória" que será revelada em mim agora dificilmente pode refletir um raio solitário de luz! Em mim - tão desobediente, tão indigno, tão pecador, vivendo tão pouco em comunhão com Aquele que é o Pai das luzes! Pode ser que em mim esta glória seja revelada? Assim afirma a infalível Palavra de Deus. Se eu sou um filho da luz por estar "nele", que é o resplendor da glória do Pai, mesmo que agora habite em meio a tons escuros do mundo, um dia irei ofuscar o brilho do firmamento. E quando o Senhor Jesus retornar a esta terra ele deve ser "admirável naquele dia em todos os que creem" (II Tes. 1:10).

Finalmente, o apóstolo aqui pesa o "sofrimento" do tempo presente em oposição a "glória", que deverá ser revelada em nós, e como ele declarou que uma "não é digna de ser comparada" com a outra. Uma é transitória, outra é eterna. Como, então, não há proporção entre o finito e o infinito, não há comparação entre os sofrimentos da terra e a glória do céu. Um segundo de glória superarão uma vida de sofrimento. O que são os anos de labuta, de doença, de lutar com a pobreza, de tristeza em qualquer forma, quando comparados com a glória da terra de Emanuel! Beber do rio da vida na mão direita de Deus, uma respiração no paraíso, um instante em meio ao sangue lavado ao redor do trono, será mais do que compensador do que todas as lágrimas e gemidos da terra.  “Porque para mim tenho por certo que as aflições deste tempo presente não são para comparar com a glória que em nós há de ser revelada”.

Que o Espírito Santo permita que tanto o escritor quanto o leitor se agarrem a isso e apropriem-se com fé e vida na posse presente e gozo disso para o louvor da glória da graça divina.

Da obra "Comfort for Christians" de A.W. Pink – Consolo nas Aflições, sofrimentos compensados, capítulo 3 - Traduzido por Edimilson de Deus Teixeira – Li em: Discernimento Bíblico.

quarta-feira, 2 de janeiro de 2013

As mulheres devem servir como Pastoras?

 
As pessoas ocasionalmente perguntam-me se as mulheres devem servir no ministério. Minha resposta é sempre: “Sim, é claro! Todos os crentes são chamados para servir e ministrar uns aos outros.”
Entretanto, eu responderia de maneira diferente se a pergunta fosse mais precisamente assim: “Há ministérios nos quais as mulheres não devem servir?” Eu argumentaria que o Novo Testamento claramente ensina que as mulheres não deveriam servir como pastoras (função à qual o Novo Testamento também faz referências usando as palavras bispos ou anciãos). Fica claro no Novo Testamento que os termos pastor, bispo e ancião referem-se à mesma função (cf. At 20.17, 28; Tt 1.5, 7; 1 Pe 5.1-2) e, no restante deste texto, usarei os termos “ancião” e “pastor” alternadamente para designar essa função.
A proibição de Paulo em 1 Timóteo 2:12
O texto fundamental que estabelece que as mulheres não deveriam servir como anciãs é 1 Timóteo 2.11-15. Lemos no verso 12: “Não permito que a mulher ensine, nem que tenha autoridade sobre o homem” (NVI). Nessa passagem, Paulo proíbe que as mulheres realizem duas atividades que caracterizam o ministério dos anciãos: ensino e exercício de autoridade. Dentre outras partes, vemos isso nos trechos referentes às qualificações para a função: Os anciãos devem ter habilidade para ensinar (1 Tm 3.2; 5.17; Tt 1.9; cf. At 20.17-34) e para liderar a igreja (1 Tm 3.4-5; 5.17). As mulheres são proibidas de ensinar aos homens e de exercer autoridade sobre eles e, portanto, não devem servir como anciãs.
Essa proibição ainda está em vigor?
Mas, a ordem de que as mulheres não devem ensinar aos homens nem exercer autoridade sobre eles foi planejada para estar em vigor hoje? Muitos argumentam que Paulo proibiu as mulheres de servirem como anciãs porque nos dias dele, as mulheres não recebiam educação e, portanto, eram desprovidas da habilidade de ensinar bem aos homens. Também existe o argumento de que as mulheres eram responsáveis pelo ensino falso que estava preocupando a congregação à qual Paulo escreveu em 1 Timóteo (1 Tm 1.3; 6.3). De acordo com essa leitura, Paulo apoiaria o serviço dessas mulheres como pastoras depois que elas fossem apropriadamente educadas, e se ensinassem sã doutrina.
A proibição está fundamentada na criação, não em circunstâncias.
Essas tentativas de relativizar a proibição de Paulo devem ser julgadas como malsucedidas. Teria sido fácil para Paulo escrever: “Não quero que as mulheres ensinem, nem que exerçam autoridade sobre os homens porque elas não foram educadas”, ou, “Não quero que as mulheres ensinem, nem que exerçam autoridade sobre os homens porque estão espalhando ensino falso”.

Contudo, qual razão Paulo realmente apresenta para a sua ordem no verso 12? A base lógica dele para tal ordem vem no verso seguinte: “Porque, primeiro, foi formado Adão, depois, Eva” (v. 13). Paulo não diz nada quanto a falta de educação ou quanto a mulheres promulgando ensino falso. Em vez disso, ele refere-se à ordem criada, à boa e perfeita intenção de Deus quando formou os seres humanos. É essencial cuidar para que a referência à criação indique que a ordem de as mulheres não ensinarem nem exercerem autoridade sobre os homens seja uma palavra transcultural, uma proibição ligada à igreja em todas as épocas e em todos os lugares. Ao dar essa ordem, Paulo não remonta à criação caída, às consequências sofridas pela vida humana como um resultado do pecado. Mais propriamente falando, ele fundamenta a proibição em toda a boa criação que existiu antes de o pecado entrar no mundo.
O motivo principal pelo qual as mulheres não deveriam servir como pastoras é comunicado aqui e, assim, o argumento da criação não pode ser rejeitado como limitado culturalmente. Além disso, o Novo Testamento contém muitas referências semelhantes à ordem criada. Por exemplo, o homossexualismo não está em harmonia com a vontade de Deus porque é “contrário à natureza” (Rm 1.26); ou seja, ele viola o que Deus pretendia quando fez seres humanos como homens e mulheres (Gn 1.26-27). Semelhantemente, Jesus ensina que o divórcio não é o ideal divino desde que, na criação, Deus fez um homem e uma mulher, significando que um homem deveria casar-se com uma mulher “até que a morte os separe” (Mt 19.3-12). Assim, também, toda comida deve ser recebida com gratidão desde que é um dom da mão criadora de Deus (1 Tm 4.3-5).
Em 1 Timóteo 2.11-15, Paulo especificamente fundamenta sua proibição de mulheres ensinando e exercendo autoridade na ordem da criação, isto é, que Adão foi criado primeiro e, depois, Eva (Gn 2.4-25). A narrativa em Gênesis é construída cuidadosamente, e Paulo, sob a inspiração do Espírito Santo, nos ajuda a ver o significado de Eva sendo criada depois de Adão. Os críticos ocasionalmente objetam que o argumento não convence desde que os animais foram criados antes dos seres humanos, mas isso falha em compreender o objetivo de Paulo. Só os seres humanos foram criados à imagem de Deus (Gn 1.26-27) e, portanto, o apóstolo comunica o sentido de Deus criar o homem antes de criar a mulher, isto é, que o homem tem a responsabilidade de liderar.
Em 1 Timóteo 2.14, Paulo apresenta um segundo motivo pelo qual as mulheres não deveriam ensinar ou exercer autoridade sobre os homens: “E Adão não foi iludido, mas a mulher, sendo enganada, caiu em transgressão”. O que Paulo pretende dizer aqui provavelmente não é que as mulheres são mais propensas a cometer erros do que os homens, pois em outro trecho as recomendou como professoras de mulheres e crianças (Tt 2.3; 2 Tm 1.5; 3.14-15), o que ele não faria se as mulheres fossem, por natureza, inclinadas ao engano. É possível que Paulo estivesse, mais uma vez, pensando no relato da criação, pois a serpente subverteu a ordem criada ao enganar Eva em vez de Adão (subvertendo, assim, a liderança masculina), ainda que exista evidência de que Adão estava com Eva quando a tentação ocorreu (Gn 3.6). O verso 14 não ensina que as mulheres são desprovidas de educação, porque engano é uma categoria moral, enquanto que falta de educação é remediada com o recebimento de instrução.
O fato de Eva haver sido enganada não pode ser atribuído a fraqueza intelectual, mas sim à rebeldia dela, ao desejo dela de ser independente de Deus. Além disso, a referência a engano aqui não indica que as mulheres de Éfeso tiveram um papel principal na difusão de ensinos falsos, pois os falsos mestres mencionados em 1 Timóteo são homens (1 Tm 1.20). De fato, se as mulheres fossem impedidas de ensinar por serem defensoras de ensinos falsos, teríamos a estranha e muito improvável situação em que todas as cristãs em Éfeso teriam sido enganadas por um falso ensino. Antes, a intenção de Paulo é dizer que o fato de Satanás haver tentado Eva em vez de Adão subverteu a liderança masculina, pois ele enganou e tentou a mulher apesar de Adão estar presente com Eva quando a tentação ocorreu. É verdade que, embora Eva tenha sido enganada antes pela serpente, a principal responsabilidade pelo pecado caiu sobre os ombros de Adão. Isso é evidente em Gênesis 3, pois o Senhor fala primeiro com Adão sobre o pecado do casal, e isso é confirmado por Romanos 5.12-19, onde a pecaminosidade da raça humana é traçada desde Adão e não de Eva.
Resumindo, 1 Timóteo 2.12 proíbe que as mulheres ensinem ou exerçam autoridade sobre homens na igreja. Essa proibição fundamenta-se na ordem da criação e é confirmada pela inversão de papéis que ocorreu na queda. Essa não é uma proibição limitada cultural ou contextualmente, que não aplica-se mais às igrejas.

O testemunho confirmativo do restante das escrituras
O que aprendemos sobre os papéis dos homens e das mulheres tomando por base a criação dos mesmos
O que vemos a respeito dos papéis dos homens e das mulheres no restante das Escrituras confirma o que lemos em 1 Timóteo 2.11-15. O livro de Gênesis dá seis evidências quanto aos maridos terem a responsabilidade principal da liderança no casamento: 1) Deus criou Adão primeiro e, depois, Eva. 2) Deus deu a Adão, e não a Eva, a ordem de não comerem do fruto da árvore. 3) Adão deu nome à “mulher”, assim como havia dado nome aos animais, indicando a sua autoridade (Gn 2.19-23). 4) Eva foi designada como “auxiliadora” de Adão (Gn 2.18). 5) A serpente enganou Eva e não Adão, subvertendo, assim, a liderança masculina (Gn 3.1-6); e 6) Deus veio primeiro a Adão, não obstante Eva houvesse pecado antes (Gn 3.9; cf. Rm 5.12-19).
O que aprendemos no ensino bíblico a respeito do casamento
O texto de Gênesis que foi mencionado concorda com o que descobrimos sobre casamento no Novo Testamento. Os esposos têm a responsabilidade principal da liderança, e as esposas são chamadas a submeterem-se à liderança de seus esposos (Ef 5.22-33; Cl 3.18-19; 1 Pe 3.1-7). O chamado à submissão para a esposa não está fundamentado em meras normas culturais, pois ela é chamada a submeter-se a seu esposo assim como a igreja é chamada a submeter-se a Cristo (Ef 5.22-24). Paulo designa o casamento como um “mistério” (Ef 5.32), e o mistério é que o casamento reflete o relacionamento de Cristo com a igreja. Então, a ordem para que os homens, e não as mulheres, sirvam como pastores concorda com o padrão bíblico de liderança e autoridade masculina dentro do casamento.
É crucial observar que um papel diferente para as mulheres não significa a inferioridade delas. Homens e mulheres foram igualmente criados à imagem de Deus (Gn 1.26-27). Eles têm igual acesso à salvação em Cristo (Gl 3.28) e, juntos, são herdeiros da grandiosa salvação que é nossa em Jesus Cristo (1 Pe 3.7). Os escritores bíblicos não lançam calúnias sobre a dignidade, inteligência e personalidade das mulheres. Vemos isso ainda mais claramente quando reconhecemos que, assim como Cristo submete-se ao Pai (1 Co 15.28), as esposas devem submeter-se aos seus esposos.
Cristo é igual ao Pai em dignidade e valor e, assim, sua submissão não pode ser compreendida como um indicador de inferioridade.

O que aprendemos em outras passagens sobre mulheres na igreja
1 Timóteo 2.11-15 não é o único texto que requer um papel diferente para homens e mulheres na igreja. Em 1 Coríntios 14.33b-36, Paulo ensina que as mulheres não devem falar na igreja. Essa passagem não proíbe que as mulheres falem absolutamente na assembléia, pois Paulo as encoraja a orarem e profetizarem na igreja (1 Co 11.5). O princípio de 1 Coríntios 14.33b-36 é que as mulheres não deveriam falar de uma maneira segundo a qual se rebelassem contra a liderança masculina ou tomassem sobre si uma autoridade injustificada, e esse princípio está em harmonia com a noção em 1 Timóteo 2.11-15, de que as mulheres não deveriam ensinar ou exercer autoridade sobre os homens.
Outro texto que nos direciona ao mesmo caminho é 1 Coríntios 11.2-16. Já vimos nessa passagem que Paulo permitiu às mulheres orarem e profetizarem na assembléia. É primordial entendermos que profecia não é um dom igual ao do ensino, pois os dons são distintos no Novo Testamento (1 Co 12.28). As mulheres serviram como profetas no Antigo Testamento, mas nunca como sacerdotisas. Semelhantemente, elas serviram como profetas no Novo Testamento, mas nunca como anciãs. Além disso, 1 Coríntios 11.2-16 deixa claro que quando as mulheres profetizassem, elas deveriam adornar-se de uma maneira que demonstrasse submissão à autoridade e liderança masculina (1 Co 11.3). Isso está de acordo com o que vimos em 1 Timóteo 2.11-15. As mulheres não são a liderança reconhecida da congregação e, portanto, não devem servir como professoras e líderes da congregação. O assunto fundamental em 1 Coríntios 11.2-16 não é o adorno das mulheres. Em todo caso, os estudiosos não estão certos de que o adorno descrito representa um véu ou um modo de usar o cabelo preso. Tal adorno era exigido nos dias de Paulo porque significava que as mulheres eram submissas à liderança masculina. Hoje, o modo como uma mulher usa seu cabelo, ou o fato de usar o véu não significa que ela é submissa ou não aos homens na liderança. Assim, deveríamos aplicar o princípio (ainda que não utilizemos a prática cultural específica) ao mundo de hoje: as mulheres deveriam ser submissas à liderança masculina, o que se manifesta em não servir como pastoras e professoras de homens.
Conclusão
As Escrituras claramente ensinam sobre os papéis únicos das mulheres na igreja e no lar. Elas são iguais aos homens em dignidade e valor, entretanto, possuem um papel diferente nesta jornada terrena. Deus deu-lhes muitos dons diferentes com os quais elas podem servir à igreja e ao mundo, mas elas não devem servir como pastoras. O Senhor não deu suas ordens para punir as mulheres, mas para que elas possam servi-lo com alegria, de acordo com a vontade dele.
Sobre o autor: Thomas R. Schreiner é professor de interpretação do Novo Testamento no Seminário Teológico Batista do Sul, em Louisville, Kentucky, onde ocupa a renomada cadeira James Buchanan Harrison. Seu livro mais recente é Run to win the prize: perseverance in the New Testament (Crossway, 2010).

Traduzido por Ana Paula Eusébio Pereira, do original em inglês: May Women Serve as Pastors? Com permissão do ministério 9Marks.
Fonte: [ Editora Fiel ]

O Blog Bereianos recomenda um excelente artigo sobre o tema, publicado na Revista Os Puritanos, clique aqui!
.

A Apologética Reformada, as Seitas e o Livre-Arbítrio

Depois de ler a obra de Erasmo defendendo a doutrina de livre arbítrio, Martinho Lutero escreveu uma resposta com o título Da Vontade Cativa. Neste volume ele respondeu a Erasmo da seguinte maneira:
…elogio e gabo muito de ti o seguinte: és o único que atacou a questão em si. Isso é, a questão essencial, e não me fatigaste com aqueles assuntos secundários sobre o papado, o purgatório, as indulgências e outras coisas deste tipo que mais são frivolidades do que questões [sérias], pelas quais até agora quase todas tentaram caçar-me em vão. Tu foste o único que reconheceu o ponto central de toda [controvérsia] e pegaste a coisa pela gola; por isso te agradeço de coração.(1)
Com estas palavras, Lutero afirmou que a coisa essencial que separa os protestantes dos católicos é que a doutrina protestante rejeita a noção do livre arbítrio e os católicos a aceitam. Lutero entendeu a doutrina de livre arbítrio como a base das heresias dos católicos e teria entendido o arminianismo como uma volta em direção a Roma. Neste ensaio nós examinaremos o livre arbítrio como é definido pelos arminianos, e veremos que o estudo das seitas revela que essa doutrina é muitas vezes central nas suas teologias.
A palavra de Lutero acerca do catolicismo pode ser aplicada muito bem à maioria das seitas. Mas se isso for verdade, então, para montar uma apologética suficiente contra as seitas será necessário também refutar essa doutrina chave. Isso significa que, no fim das contas, somente uma apologética plenamente reformada é adequada para conseguir a derrota das teologias e heresias das seitas. Uma apologética comprometida com o arminianismo já concorda com as seitas sobre a questão central da autonomia metafísica do ser humano. Veremos que isso tem implicações graves que inevitavelmente solapam tal apologética. Por outro lado, a apologética reformada é capaz de detonar a base das heresias e mostrar que todas elas levam logicamente ao irracionalismo e, finalmente, o niilismo. Neste trabalho estudaremos o mormonismo como exemplo para demonstrar a eficácia da apologética reformada contra as seitas.

I. Definições: dois posicionamentos em contraste
A. O Arminianismo
Primeiro é preciso determinar exatamente o que está em jogo. A questão é o relacionamento entre a soberania de Deus e a vontade do ser humano. Nós enfrentamos nesta questão duas visões distintas da natureza humana, e finalmente, da natureza de Deus também. Começaremos com a descrição do livre arbítrio segundo o arminianismo atual.
Clark Pinnock é talvez o defensor do arminianismo mais conhecido atualmente. Ele é um bom representante das correntes do arminianismo porque ele, na sua teologia, trabalha conscientemente para esclarecer e defender as implicações lógicas da teologia arminiana. No seu livro Grace Unlimited (Graça ilimitada), ele define o livre arbítrio como a capacidade original do homem de "escolher entre a obediência de amor e a desobediência da rebeldia, gozando o livre arbítrio no sentido mais pleno, sem nenhuma coerção".(2) Na mesma página ele diz que o homem tem o poder de um desempenho ativo na produção da história e da sua própria vida. O ser humano tem o poder de literalmente criar o futuro do nada.
O significado disso é que os arminianos não estão apenas apoiando o conceito da capacidade do ser humano de escolher livremente segundo os seus desejos, mas ainda limitada pelos parâmetros da sua natureza humana e pecaminosa. A posição arminiana diz que a vontade humana é independente de qualquer predeterminação. Mesmo admitindo a existência de influências, os arminanos fazem questão de dizer que elas não determinam as ações do arbítrio humano. Assim, o arbítrio não é limitado nem pela condição humana, nem pelo conselho eterno de Deus. Ele é indeterminado. Para eles, "livre arbítrio" quer dizer que o arbítrio atua como uma causa sem causa. Ele pode causar eventos, mas as suas escolhas não são o resultado de outros eventos prévios. O ser humano, portanto, tem a capacidade de iniciar na história algo totalmente novo, ou, nas palavras de John Sanders, nossa resposta a Deus é, num sentido real, ex nihilo.(3) O ser humano é um criador tanto como Deus.
Assim, Pinnock pode negar que a vontade de Deus seja sempre cumprida. Ele assevera que ela é algo que pode ser rejeitada e anulada. A história é o palco de uma luta contra Deus e as potestades e o ser humano é um dos lutadores. Deus não está dirigindo os dois lados, mas o lado do mal tem independência metafísica de Deus, e assim, não está sob o controle soberano dos decretos de Deus.(4)
Essa definição breve basta para mostrar que nos bastidores do conceito do livre arbítrio encontrase a noção de um ser indeterminado, que é o pano de fundo dos eventos da história. Em outras palavras, todos os seres, inclusive Deus, são participantes num drama cujos atores geram o roteiro a cada momento, sem nenhuma força que determina previamente qual será o resultado. É um roteiro sem autor, mas sim com muitos autores que estão contribuindo com sua parte, criando, do nada, a história. As escolhas e ações dos atores são indeterminadas, ou seja, não causadas por condições prévias. Cada uma é totalmente livre e autônoma. O palco onde o drama está sendo realizado é o do ser em geral, no qual todos participam, mas que é impessoal, caótico, e indeterminado. Mesmo Deus é sujeito às suas mudanças aleatórias, embora Ele esteja fazendo o melhor que seja possível para assimilar e controlá-lo.
O arminianismo nos apresenta uma criação que não é totalmente criada ainda. Cabe ao ser humano funcionar como co-criador com Deus. Assim, o futuro está totalmente aberto. Isso leva alguns arminianos, como Pinnock, a negar que Deus tem conhecimento do futuro.(5) O que não existe ainda não pode ser conhecido. Se Deus conhecesse o futuro, ele seria determinado e essa necessidade não seria consistente com o livre arbítrio. Para preservar a autonomia do homem é preciso negar a onisciência de Deus, segundo Pinnock.
As implicações e problemas que se seguem dessa visão do livre arbítrio são enormes. Eles são expostos por R. K. McGregor Wright no seu livro A Soberania Banida.(6) Dr. Wright mostra claramente que o arminianismo implica que o universo é controlado por acaso e que isso leva ao irracionalismo e a destruição de qualquer base para a responsabilidade do homem por suas ações. Além disso, o deus dos arminianos é essencialmente finito. Ele é limitado pelo ser em geral, do qual ele faz parte e que é maior que ele. O que nos interesse agora é o fato, também notado por Dr. Wright, de que essa visão de acaso ou caos atrás de tudo é essencialmente a visão pagã do mundo que se encontra nas várias religiões e filosofias não-cristãs. O que elas têm em comum é o desejo de proteger a autonomia metafísica (livre arbítrio) do homem de qualquer intrusão do Deus soberano. Várias das seitas defendem a doutrina do livre arbítrio como o mesmo resultado.
B. O calvinismo
Uma visão radicalmente diferente de Deus, do universo e do homem existe na cosmovisão do calvinismo. Calvino declara nitidamente a posição reformada nas Institutas. As Escrituras, segundo Calvino, negam que as coisas aconteçam por acaso. Embora a razão carnal sempre atribua ao acaso o destino das pessoas, o crente não deve pensar assim. Sejam bons, sejam maus, os eventos são todos governados pelo plano secreto de Deus. A mão de Deus está dirigindo todas as coisas para cumprir os seus propósitos.(7) O Deus onipotente é ativo e está envolvido em tudo o que acontece. Deus não é apenas a causa primária das coisas, o motor imóvel, mas sim o agente que regula todas as coisas de tal maneira que nada acontece sem a sua deliberação. Por causa disso, o crente não tem que temer as estrelas e outros sinais dos céus como os não-crentes temem. Todas essas coisas são governadas pelo plano secreto de Deus de modo que nada aconteça que não é conscientemente e livremente decretado por Deus.(8) A presciência de Deus é compreensiva, mas não é apenas fundamentada no olhar de Deus para o futuro. Deus conhece o futuro porque é ele que determina o futuro. Assim, todos os eventos procedem do plano fixado de Deus e nada acontece por acaso.(9)
O controle de Deus inclui especificamente a vontade do homem. Os homens são sujeitos totalmente à vontade de Deus e nada podem fazer sem o poder de Deus.(10) O ser humano não é autônomo, e a sua vontade não é independente da determinação de Deus. O acaso e o destino são palavras pagãs e o povo de Deus nem deve gastar tempo pensando nelas.(11)
O Deus testemunhado por Calvino e a teologia reformada é radicalmente diferente do Deus dos arminianos. O Deus afirmado pela teologia reformada não faz parte do ambiente ontológico comum com os seres humanos e as demais criaturas. Deus é o seu próprio ambiente porque não existe uma realidade atrás dele ou além dele no qual ele existe. Em hipótese alguma a ontologia bíblica permite que o homem e Deus sejam incluídos juntos num ser geral. Se existisse, tal serseria necessariamente impessoal e mais fundamental na natureza da existência do que o próprio Deus. Deus seria apenas mais um elemento no universo assim como o homem.
O Deus de Calvino e da teologia reformada não existe como só um elemento num ser comum com a criação. Este Deus é o Deus que a Bíblia afirma como o Criador de todo ser além de si mesmo. Pelo poder de sua palavra Deus falou e criou o universo do nada, "pois ele falou, e tudo se fez; ele mandou, e logo tudo apareceu" (Sl. 33.9). Assim, a Bíblia afirma a doutrina da distinção entre o Criador e a criatura. Essa doutrina é um dos pressupostos fundamentais da cosmovisão cristão, sem o qual não existe mais o cristianismo. A negação dessa doutrina e a confusão da criatura com o Criador que se segue dessa negação é a característica básica do pensamento pagão que Paulo condena em Romanos 1.22-25.
Enquanto a ontologia arminiana postula que Deus e o homem são igualmente participantes num ser impessoal geral, que seria necessariamente superior e independente dos dois, a ontologia bíblica, afirmada pelo calvinismo, diz que Deus é o Ser original, independente, derradeiro, e altamente pessoal, que livremente criou o ser e o universo. Este ser, com "s" minúsculo, é totalmente dependente do decreto criativo de Deus. A história dos eventos deste ser é também criada e dependente no decreto de Deus. Portanto, toda ação criativa do ser humano e todas as suas escolhas, são derivadas e dependentes do decreto de Deus também.
Deus é a causa primária do universo, pois ele o criou. O decreto de Deus não apenas deu origem ao universo como tal, mas também estabeleceu a realidade da causalidade entre todos os eventos da história, ou seja, a causalidade secundária.(12) Portanto, os eventos que acontecem não são indeterminados e não acontecem por acaso, como a teoria de livre arbítrio implica. Eles são determinados pela causalidade natural que vincula cada acontecimento, e, finalmente pelo plano de Deus. Quando uma bola de bilhar bate numa outra, o movimento da segunda é causada pela força da primeira, mas tudo dentro do controle soberano de Deus.
As escolhas das pessoas também fazem parte da causalidade secundária. Elas são determinadas pelos eventos anteriores e determinam eventos posteriores. As decisões e ações do ser humano são assim incluídas na causalidade natural que é, finalmente governada pelo plano de Deus. Portanto, as ações das pessoas também não acontecem por acaso.
Mas, isso quer dizer que a pessoa é uma máquina ou robô programado? Uma escolha determinada é significativa? Essas são indagações importantes e a teologia reformada tem resposta adequada. A resposta é encontrada na idéia de livre agência. O agente livre não age fora do conselho determinado por Deus, mas a vontade não é sujeito a uma coerção contra seus desejos. Ela é livre para deliberar e determinar qual caminho é que ela vai seguir segundo seu próprio querer, personalidade, e caráter, no contexto das influências sociais e espirituais que existe na sua vida. As escolhas que ela faz têm significado porque são elos na cadeia de causalidade que vinculam todos os eventos que acontecem. Essas escolhas funcionam como causas reais e concretas dos eventos, circunstâncias e resultados que se seguem delas. As escolhas do agente livre são causadas pelo caráter e os desejos da própria pessoa. Destarte, as personalidades das pessoas participam plenamente na operação da vontade.
No universo dos arminianos isso seria impossível. Num universo indeterminado não poderia existir uma cadeia de causalidade. Cada acontecimento seria um evento independente, sem vinculo com os outros. As escolhas das pessoas, sendo eventos, também seriam indeterminados e sem vinculo com outros eventos. Escolhas indeterminadas não podem determinar nem outros eventos nem as subseqüentes escolhas das pessoas num universo onde tudo é indeterminado. O livre arbítrio significa a negação da responsabilidade e da coerência da personalidade humana. Mas no universo dos calvinistas, o decreto soberano de Deus estabelece e sustenta a livre agência do homem e o significado de toda a sua atividade.
O contraste entre o universo dos arminianos e o dos calvinistas não pode ser mais distinto. De um lado nós temos um ser impessoal que abrange tudo, Deus incluído, numa teia de contingência ou acaso puro. Deus é assim limitado e o homem é deixado boiando num mar de acaso puro que nem ele, nem Deus podem dominar. Do outro lado, nós temos o Deus Trino independente que completamente só constitui o Ser original, pessoal e não criado. Segundo seu plano e decreto ele fez e mantém todas as coisas com todas as suas relações umas com as outras, dando significado a cada fato. Essa criação, na sua totalidade, coisas e eventos, matéria e energia, espaço e tempo, é um ser dependente e distinto de Deus, que encontra o seu propósito em cumprir o plano de Deus pela glória de Deus.

II. Livre Arbítrio e as Seitas
A distinção entre a teoria do livre arbítrio, segundo o arminianismo, e a livre agência, segundo o calvinismo, revela que a questão em jogo é a distinção entre duas cosmovisões diferentes. Com essa distinção em mente, podemos voltar à tese principal deste trabalho, a saber, que a teoria do livre arbítrio segundo arminianismo é basicamente igual da teoria de livre arbítrio que se encontra nas seitas. Assim, existe um pano de fundo ontológico comum entre o arminianismo e as seitas, que está ausente na Bíblia. Portanto, qualquer apologética fundamentada em princípios arminianos será inadequada para confrontar as seitas. É preciso uma apologética conscientemente reformada, alicerçada na soberania de Deus. Essa tese será demonstrada primeiro através de observações da doutrina de livre arbítrio em várias seitas, e depois, uma exposição mais profunda das conseqüências da doutrina de livre arbítrio na teologia dos mórmons. Primeiro, é preciso demonstrar como a doutrina arminiana é parecida à das seitas.
No livro, Reasoning From Scripture, as Testemunhas de Jeová declaram que Deus não predestina os eventos da história. Deus não decretou a queda de Adão. Ele nem previu que a queda aconteceria.(13) Citando Ecl. 9:11 a Torre de Vigília ensina que muitas coisas acontecem puramente por acaso. Esses eventos são desconhecidos de antemão.(14) Jeová, segundo a Torre de Vigia, pode desligar seu conhecimento do futuro. Ele é capaz de conhecer os eventos, mas opta por se limitar a somente poucos eventos, para não violar o livre arbítrio dos seres humanos.(15)
Deus pode conhecer ao futuro mais ele também pode não o conhecer.(16) Ele não predestina alguns a salvação e outros para a reprovação, mas sim respeita o livre arbítrio de cada um. (17)
É óbvio que, quanto a questão do livre arbítrio, a doutrina das Testamunhas de Jeová é igual à dos arminianos. Entretanto, as TJ's não têm o receio de admitir que logicamente isso limita a presciência de Deus, enquanto a maioria dos arminianos prefere ignorar este ponto e continuar crendo que Deus conhece o futuro. Pinnock, ao rejeitar a presciência de Deus, nitidamente se coloca no lado das TJ's. Ele mostra que, logicamente, o paralelo entre o ontologia dos arminianos e o das TJ's permanece intacto.
Albert Pike fala sobre a noção do livre arbítrio na maçonaria. O livre arbítrio é representado pelo símbolo de Satanás, que não é um ser pessoal. Disse ele: "para os iniciados, isso (Satanás) não é uma pessoa, mas uma força, criado para o bem, mas que podia servir para o mal. Ele é o instrumento da liberdade ou o livre arbítrio."(18) A maçonaria, sendo uma religião gnóstica, também coloca Deus num ser comum com o homem.
O Reverendo Sun Myung Moon, da Igreja de Unificação, ensina que há um sincretismo entre a ação de Deus a ação do homem para cumprir o propósito de Deus. O homem não depende totalmente de Deus para alcançar a perfeição, mas ele depende no seu próprio desempenho.(19) O ser comum, compartilhado por Deus e as criaturas, na teologia de Moon, é mais pronunciado do que no caso dos arminianos, porque Deus, segundo Moon, gerou as criaturas do seu próprio ser. Mas mesmo assim, a noção de autonomia é igual.
L. Ron Hubbard, o fundador da Cientologia, também defendeu o livre arbítrio do seu livro, Dianetics. Segundo Hubbard, o homem é organismo auto-determinado. Se ele não fosse assim, ele seria reduzido ao nível de animal.(20) Por isso, ele precisa da terapia oferecida pela Igreja de Cientologia. Somente isso pode livrá-lo das influências externas que limitam o livre arbítrio.
A Ciência da Mente, um precursor do Movimento da Nova Era, ensina o panteísmo e a divinidade de todas as pessoas. Esta seita acredita que "o homem deve ser criado com a possibilidade de liberdade ilimitada e deixado em paz para descobrir a si mesmo".(21) Se ele sofrer, não é por causa de algum decreto divino, mas simplesmente por que ele violou a Lei da Realidade na sua ignorância.(22) Essa cosmovisão põe o ser humano entre a liberdade absoluta de um lado e um destino impessoal e rígido no outro lado.
Nestas breves citações nós temos uma amostra das idéias sobre o livre arbítrio que se encontram nas seitas. Apesar de algumas diferenças, a noção da autonomia metafísica do homem de qualquer causalidade anterior é um elemento comum. Podemos ampliar a lista com outras seitas, mas isso não é necessário para sustentar o argumento. Devemos refletir sobre o fato de que o calvinismo é declarado o inimigo tanto pelas seitas quanto pelos arminianos. Será que isso é acidente? Qual poderia ser a fonte dessa declaração comum? Devemos refletir nisso enquanto continuamos nosso estudo. Faremos isso através de um exame mais profundo de mais uma seita que também defende o livre arbítrio, a saber, o mormonismo.
III. A Cosmovisão dos Mórmons
Segundo o autor mórmon, LeGrande Richards,
    As escrituras sagradas não sustentam a posição extrema de muitos do tipo de pensamento: (1) que alguns são predestinadas a vida eterna é apesar de suas ações, eles a alcançarão, enquanto outros são predestinados à reprovação eterna, e se predestinados assim, não podem fazer coisa alguma sobre isso.(23)
É claro que Richards deturpou a doutrina da predestinação, mas é igualmente claro que ele negou qualquer predestinação divina. O líder mórmon, Bruce McConkie, escreveu que a "agência é a capacidade de escolher o bem ou o mal. Ela é um princípio eterno que existira com Deus desde toda eternidade".(24) Essa agência é o poder de escolha.(25) McConkie não permite nenhuma dúvida quanto à oposição da doutrina da agência segundo mormonismo, ao calvinismo. As igrejas que ensinam que os homens são predestinados a receber a salvação ou maldição, segundo a eleição de Deus, não encontram nenhum lugar na sua teologia de agência. Seu raciocínio é assim: por que há a necessidade da agência, para ser capaz de fazer boas obras que levam à salvação, se a salvação é determinada pela Divinidade na base da predestinação apesar das obras? Portanto, segundo McConkie, a "falsa" doutrina da predestinação dá luz à falsa doutrina que os homens não são livres para efetuar a sua própria salvação, como é feito possível pelo sacrifício expiatório de Cristo.(26) Assim, a noção do livre arbítrio, ou a autonomia do homem de Deus, é defendida de forma semelhante a dos arminianos. A presença desta doutrina na teologia mórmon é central para seu conceito de Deus, homem, salvação e o universo.
A. Deus e Homem
Joseph Smith estabeleceu os parâmetros da doutrina de Deus que ainda prevalece entre os mórmons no seu King Follet Discourse (Discurso do Rei Follet). Ele disse que "o próprio Deus foi uma vez como nós somos agora, e é um homem exaltado, e assenta no trono lá nos céus! Isso é o grande segredo. Se o véu fosse rasgado hoje, e o grande Deus que segura este mundo na sua órbita, e que sustenta todos os mundos e todas as coisas por seu poder, fosse se tornar visível, - eu digo, se vocês vissem-no hoje, vocês o viriam na forma de homem - igual a vocês na pessoa, imagem, e mesmo a forma de homem." (27)
Obviamente, a implicação lógica dessa noção é que Deus é um ser finito. Sterling McMurrin, filósofo mórmon, explica a natureza do Deus dos mórmons no seu livro The Theological Foundations of the Mormon Religion (O alicerce teológico da religião mórmon). Segundo McMurrin, os mórmons descrevem Deus com "linguagem não-absoluta como um ser condicionado por e relacionado ao mundo do qual ele faz parte e que, desde que ele [o mundo] não é, no fim das contas, a sua criação, não é completamente sob o seu domínio".(28) Este Deus não é o criador nem dos elementos fundamentais do universo nem do espaço e tempo. Ele é mais parecido com o demiurgo de Platão. Ele é um artesão que trabalha com a matéria crua do universo para dar-lhe forma. Deus existe no ambiente do universo físico, junto com os demais seres e mentes. Os princípios que estruturam o universo fazem parte deste ambiente. McMurrin afirma que é um artigo fundamental da teologia dos mórmons que Deus se relaciona com um ambiente mundial do qual ele não é o alicerce e pelo que ele mesmo é condicionado. Deus é somente um ser entre outros seres, não a origem de todo ser, e assim ele é finito em vez de ser absoluto.(29)
A distinção entre o Criador e a criação é negada pela doutrina de Deus do mormonismo. McMurrin nota que isso é muito parecido com a posição do naturalismo filosófico, como se encontra na filosofia dos gregos antigos e dos humanistas de hoje.(30) A existência do universo não é atribuída ao ato criativo de Deus. O universo apenas existe; ponto final. Deus não é a totalidade do ser original e não é a fonte derradeira de todo ser. McMurrin corretamente diz que isso é um desvio radical do teísmo tradicional, seja teísmo cristão, judaico ou islâmico. Portanto, há uma negação fundamental da distinção entre o sobrenatural e o natural na teologia mórmon. Deus é apenas mais um ser natural entre todos os outros porque tudo que existe é o universo natural. Não existe nenhuma ordem divina que é distinta da ordem física da experiência normal. Deus existe no tempo e espaço. Não existe substância imaterial. Deus tem um corpo tanto quanto o homem.(31)
Ontologicamente, Deus e homem existem como seres finitos numa realidade, um ambiente ontológico, comum. A distinção entre os dois pode ser descrita mais como uma distinção quantitativa do que qualitativa. A limitação de Deus ao universo temporal quer dizer que Deus está em processo, como todos os seres conscientes. Diz McMurrin:
Deus é colocado, portanto, nem por cima nem por fora, mais por dentro do processo continuo do universo. A imutabilidade da realidade é assim negada, e a história mundial, a historia humana, o desempenho humano, as coisas que os seres humanos conseguiram, e a liberdade humana, ganham um significado novo, porque o futuro é real e único, não apenas da perspectiva do homem, mas também da ótica de Deus.(32)
Dessa visão da realidade, irrestivelmente se segue à noção da "grande cadeia do ser", que diz todo ser está evoluindo através de uma escala de existência para as regiões mais altas. O conceito da "grande cadeia do ser" é a tentativa pagã de resolver o problema do Um e do Múltiplo (o Um e os Muitos).(33) Este problema lida com a necessidade de descrever a relação entre a diversidade de coisas que existem e a unidade aparente atrás de todas as coisas. Por exemplo, existem muitos cachorros, mas o que é o conceito comum de "cachorro" que serve para unificar todos eles numa classe só de animais? O que é último, a unidade ou a diversidade? Sendo sem resposta, a mente não-cristã resolve a tensão entre a unidade absoluta, que absorve e destrói a individualidade, e a diversidade absoluta, que reduz tudo a entidades caóticas e sem vinculo umas com as outras, através da criação desta cadeia. A diversidade - e o caos do não-ser - fica em baixo, e a unidade - o ser perfeito - fica por cima. Todas as coisas têm seus lugares como elos na cadeia, com as mais perfeitas, que participam no ser absoluto, nos lugares superiores.
A cadeia é também vista como uma escada cujos vários níveis levam os seres cada vez mais perto da divindade. Todas as criaturas têm seus lugares na escada que começa no caos do não-ser e ascende para a unidade do ser absoluto. Este conceito, que vem do ocultismo, valoriza os seres mais altos, e, geralmente, as várias religiões pagãs incluem algum mecanismo cujo propósito é levar as criaturas e entidades caídas de volta para cima. No hinduismo e espiritismo o mecanismo é a reencarnação. No catolicismo romano é o sistema sacramental. No mormonismo é a progressão eterno, que é o plano de salvação dos mórmons.
O homem, segundo mormonismo, foi colocado na terra para progredir de seu estado inferior até ele se tornar um ser divino, um deus. Isso foi o que o Deus fez. O homem é um filho espiritual de Deus, mas mesmo isso significa apenas que a atividade criativa de Deus somente organizou e deu forma à essência individual de cada ser humano nesta terra. Essa essência essencial existia sempre e segundo mormonismo, é, como McMurrin relata, não-criada, não-derivada e sem início. Neste esquema, a diversidade é a realidade ulterior (como a unidade é no hinduismo). A realidade é vista como uma pluralidade de particulares indeterminados.(34) Destarte, o universo é contingente, ou indetermindado, e o futuro está aberto, sendo um mistério tanto para Deus quanto para o homem.
B. O problema do mal
Os mórmons asseveram que a sua teologia resolve o problema do mal porque seu Deus não pode ser acusado de o ter criado. A liberdade (livre arbítrio) é uma propriedade da pessoa não-criada e a probabilidade da existência do mal moral faz parte da estrutura original das coisas.(35) Deus enfrenta o mal como um fato do universo, e a natureza divina luta contra ele. Segundo Joseph Smith, o mal moral é uma das existências eternas tanto como espaço e tempo.(36) O bem moral também existe independente de Deus. O bem e o mal existem como duas realidades iguais segundo o Livro de Mórmon, porque na natureza do universo há a necessidade de uma oposição em todas as coisas (2 Nefi 2:11-17). McMurrin mostra que isso não significa apenas que o mal existe para possibilitar o bem, mas, e isso é uma idéia muito mais forte, que o mal deve existir simplesmente porque ele existe inevitavelmente. McMurrin é certo ao afirmar, que a noção da existência do mal assim desenvolvida no Livro de Mórmon é inconciliável com a doutrina de criação ex nihilo como na teologia de Agostinho.(37) Obviamente a visão dos mórmons tem muito mais em comum com o maniqueísmo que Agostinho abandonou e refutou do que a doutrina de criação que ele defendeu e que se encontra na teologia reformada também.
C. Mormonismo e Arminianismo
Nós vimos nas citações acima que os mórmons defendem a noção de autonomia, o livre arbítrio, igual ao conceito arminiano. 2 Nefi:2, no Livro de Mórmon, desenvolve as implicações do livre arbítrio na teologia dos mórmons. O argumento começa com o dualismo ético e afirma que a queda do homem no pecado foi na verdade uma coisa boa, desde que o homem carecia do conhecimento do bem e do mal que ele precisava para atingir a sua divindade. No fim, o argumento chega ao clímax com a afirmação da glória da autonomia humana. McMurrin explica que isso é uma rebelião contra a doutrina do pecado original, e que o homem, na teologia dos mórmons, não sofre de uma natureza pecaminosa.(38) O Livro de Mórmon, segundo McMurrin, reflete a reação arminiana contra calvinismo - e contra qualquer forma de predestinação!(39) O livre arbítrio é supremo e deve ser defendido em tudo.
O livre arbítrio afirmado pelo mormonismo é o poder pleno de escolhas contrárias, no mesmo sentido que é defendido por Pinnock. Essa visão é exatamente igual ao conceito arminiano e subentende uma visão metafísica que é similar também. É somente por falta de consistência lógica que os arminianos não vão tão longe no seu desvio da ortodoxia cristã como os mórmons. O mórmon admite que a sua posição em prol do livre arbítrio destrói completamente a distinção entre o Criador e a criação enquanto o arminiano tenta ignorar essa dificuldade óbvia.
Não deve ser uma surpresa que o arminianismo, no fim das contas, não pode refutar o mormonismo com êxito. Eles têm pressupostos comuns acerca da autonomia do ser humano. Nos dois sistemas Deus enfrenta um mistério último que dá cabo de sua onisciência e presciência (apesar das reclamações de alguns arminianos ao contrário). Existe uma área de ser sobre o qual tanto Deus quanto o homem não podem conhecer coisa alguma. Existe a possibilidade que algum fator ainda desconhecido possa surgir e acabar com o plano de Deus. Algum fato ainda não descoberto poderia demonstrar que todo nosso conhecimento e o conhecimento de Deus seja falso. Assim, o alicerce da revelação na Bíblia está em dúvida. Como é que o arminiano pode argumentar que a revelação que ele recebeu na Bíblia é superior ao Livro de Mórmon quando nem todos os fatos são conhecidos e nunca serão? O domínio do ser desconhecido pode romper e destruir todo que nós achamos que é verdadeiro hoje. O empirismo da apologética arminiano, e também o próprio arminanismo devem ser abandonados o mais rápido possível!
IV. Uma resposta Reformada
O esboço de uma resposta reformada mostra que somente uma apologética alicerçada na soberania de Deus, como é apresentada na teologia da reforma, é capaz de refutar as heresias do mormonismo. O argumento depende das obras de Cornelius Van Til e Gordon H. Clark, dois dos três apologetas mais importantes do século 20 (o terceiro é o batista Carl F. H. Henry - Van Til e Clark eram presbiterianos). Ficará nítido que somente uma filosofia enraizada no Deus Trino da Bíblia cujos decretos controlam tudo que há de acontecer pode defender a fé cristã e erguer uma cosmovisão adequada.
O método é a argumentação através dos pressupostos. Isso quer dizer, indicar os pressupostos que formam a base metafísica e epistemológica da sua cosmovisão e demonstrar que estes pressupostos, e somente estes, podem sustentar uma interpretação do universo que não termina no irracionalismo. O argumento revela os pressupostos da posição não-cristã e mostra que ela acaba destruindo a possibilidade de conhecimento e qualquer interpretação racional da realidade.
A. Deus e homem
O conceito reformado de Deus afirma que Deus é absoluto. Os seus atributos são atributos de um ser infinto. O significado disso é que nem o ser de Deus, nem o plano de Deus são condicionados por qualquer coisa fora do próprio Deus. Deus é eterno porque ele transcende o tempo e é onipresente porque ele transcende o espaço, embora ele esteja presente em todo lugar no espaço. O conhecimento de Deus é auto-referêncial. O seu conhecimento não é derivado de uma outra fonte, fora de Deus, mas é original com Deus.(40) Ele não conhece o futuro porque ele olhou para frente e o assistiu como se fosse um vídeo. Ele conhece o futuro porque ele conhece os seu plano original e exaustivo e determinou o futuro segundo este plano.
Van Til também explica que Deus é personalidade absoluta. Os atributos de Deus não são abstratos, mas refletem a atividade moral de Deus. Não existe nenhum princípio de verdade, do bem, ou da beleza ao lado de Deus ou por cima de Deus segundo cujo padrão ele fez ou organizou o mundo. Os princípios de verdade, bem e beleza são idênticos com a essência de Deus e essa essência é puramente pessoal. Nós somos pessoas também, mas pessoas somente num sentido finito. Há uma distinção qualitativa, não apenas quantitativa entre nós e Deus.(41)
A personalidade de Deus implica a doutrina da pluralidade de pessoas no único ser de Deus. As três pessoas são "co-substanciais" ou seja, nenhuma é derivada das outras. A unidade e a diversidade são igualmente originais. Isso é um ponto importante para resolver as dificuldades que os arminianos e mórmons não conseguiram resolver. Como Van Til nota, "para nós tudo depende por seu significado neste tipo de Deus". (42)
Mais um pressuposto essencial na fé reformada é a distinção entre o Criador e a criação. Como foi descrito acima, a Bíblia defende uma distinção absoluta entre a criação e o Deus criador. O Deus Criador é o Ser original, não-criado, eterno, absoluto, etc. Ele criou o ser dependente do universo, que é distinto da sua própria essência. A fé reformada nega que existe um ser geral que abrange Deus e a criação juntos. Deus não existe no ambiente de um universo maior que ele, que inclui os outros seres também. Deus conhece seu próprio Ser completamente e também o ser do universo que ele criou. Para ele, não há mistério, nem no seu Ser, nem na criação.
O Deus finito dos mórmons supostamente revela várias informações através das escrituras dos mórmons e dos profetas. Tais revelações são necessariamente limitadas às porções do universo que este Deus finito já pesquisou, conquistou e está manipulando. Existem áreas vastas no espaço que ainda têm de ser organizados por outros deuses. Portanto, as revelações de mormonismo são nada mais do que as interpretações de seres finitos de um universo que é finalmente um mistério. A sua essência nunca pode ser penetrada por seres finitos porque isso exigiria um conhecimento verdadeiramente exaustivo de todos os fatos, passados, presentes e futuros. Para os deuses dos mórmons, muito sempre permanecerá desconhecido. Logicamente, o mórmon não tem garantia nenhuma contra a possibilidade de que em algum lugar distante no universo ainda não conhecido serão encontrados outros deuses, mais poderosos, que não concordam com o plano dos mórmons, e que derrotarão os deuses dos mórmons e botarão todos eles, com os próprios mórmons, no lago de fogo eterno. McMurrin nota que alguns teólogos mórmons reconhecem o problema, mas escondem este fato atrás de linguagem absoluta. Os mórmons freqüentemente falam de Deus como se fosse eterno, infinito e absoluto, mais isso é realmente somente relativo à condição do ser humano.(43)
Obviamente, tal "deus" não pode garantir a segurança do futuro de ninguém. O uso da linguagem absoluta é ou um engano, ou desonestidade, mas de forma alguma representa a verdade. Mas essa linguagem serve para apagar o medo do mórmon típico, que nunca ousa fazer perguntas desta natureza sobre a sua fé. Logicamente, a mesma conclusão é aplicável ao arminianismo, quando levado à sua conclusão lógica. Somente um Deus que controla tudo que acontece, o Deus absoluto, pode garantir que não existem outros poderes no universo, maiores que ele mesmo. Somente um Deus que é a origem de todo conhecimento e que não enfrenta mistério no universo pode dar uma revelação infalível e inerrante. E somente se existe tal revelação, conhecimento de qualquer tipo é possível. Embora o homem enfrente mistério no universo, ele pode ter conhecimento verdadeiro e confiável porque ele recebeu a revelação inerrante de Deus na Bíblia. Esta revelação serve como a base epistemológica de todo conhecimento humano.
B. O Problema do mal
A reivindicação de que o mormonismo resolve o problema do mal não tem base ao examinar os fatos. O problema principal é que, no fim das contas, a cosmovisão do mormonismo não dá base nenhuma para distinguir entre o bem e o mal. O bem e o mal se tornam conceitos arbitrários. Os mórmons dizem que o bem e o mal são conceitos absolutos que existem na natureza. Mas eles também dizem que não existem substâncias imateriais. Isso significa que, em algum sentido, o bem e o mal devem ser substâncias materiais. Mas isso é absurdo. O bem e o mal são idéias, e como tal, não podem existir a não ser que nas mentes de seres pessoais.
Agora, se não existisse nenhuma mente absoluta, distinta e soberana sobre toda a criação, então os conceitos do bem e do mal só existiriam em mentes igualmente finitas. Tais mentes seriam igualmente condicionadas pelas forças impessoais, irracionais, e matérias do ser em geral do universo que seria o ambiente comum dessas mentes. Em outras palavras, as idéias de um ser finito não podem ter prioridade sobre os outros seres finitos. Todas são iguais. Assim, no universo dos mórmons, cada ser teria sua própria idéia sobre o bem e o mal, e todo discurso sobre ética seria apenas uma questão das opiniões das várias mentes finitas. Então, o que uma pessoa (ou um deus) acha que é o bem pode ser o que uma outra acha que é o mal. Não haveria tribunal de apelação superior. No fim, a vontade do ente mais avançado e poderoso venceria. Assim, a situação fica pior ainda para o mórmon, porque não é que ele apenas não pode saber se o deus dele pode manter seu poder no futuro e não ser derrotado por algum inimigo, mas o mórmon nem sabe se seu deus é certo ou não! O conceito do bem no mormonismo é puramente arbitrário. Se não estivessem os mórmons levando emprestado os valores bíblicos que eles herdaram da reforma eles não poderiam ter qualquer ética.
Gordon Clark demonstrou que a resposta do problema do mal é que simplesmente não há ser superior a Deus. Por isso não há padrão do bem e mal que é além de Deus. O padrão é o caráter de Deus como é expressado nos seus decretos. Se Deus faz algo, então, isso é, por definição, certo. Não há lugar para o homem pode julgar Deus.(44)
Conclusão
O mórmon se considera um ser livre e capaz de interpretar a realidade sem referência ao Deus Trino que determina tudo. Nesta visão, ele obtém o conhecimento através de meios empíricos, enquanto ele e os seus deuses trabalham para superar o domínio do mistério ulterior do universo. A salvação vem através do trabalho e mérito do indivíduo autônomo. É assim que o homem se torna deus. Mas, para ter essa autonomia, ele paga um preço muito alto. Porque, no fim, ele não pode confiar na sua salvação e ele nunca sabe se as suas obras são suficientes ou se uma força o fator não previsto vai arruinar tudo.
O conceito de autonomia metafísica, o livre arbítrio, é responsável pela bagunça epistemológica e ética demonstrada aqui. O mormonismo pressupõe um universo impessoal e materialístico que produz um deus finito, cego quanto ao futuro e a essência das coisas, e incapaz de se proteger contra o caos do misterioso mar do ser que é seu ambiente comum com o homem. Ele é um deus fraco que não é digno de louvor ou da imitação dos seres humanos. O conceito mórmon de deus é exatamente o contrário do que a Bíblia ensina. Mas, logicamente, é muito parecido com o arminianismo.
O arminianismo é inadequado para refutar os mórmons, porque ele sofre de muitos dos mesmos defeitos. Existendo num ser comum com o homem, igual ao deus mórmon, o dos arminanos também é limitado pela sua criação. Logicamente, o arminano não pode afirmar que a Bíblia é superior ao Livro do Mórmon porque os dois são revelações de deuses limitados pela autonomia do ser humano, e o ser geral que eles não criaram. Os arminianos não têm resposta à limitação do conhecimento de Deus porque seu Deus é circundado pelo mistério tanto quanto o deus dos mórmons. A epistemologia arminiana, em fim, acaba no mesmo lugar da epistemologia mórmon.
Os arminanios também não conseguem propor uma solução ao problema do mal que é superior à dos mórmons. O Deus arminiano, logicamente, não é o ser derradeiro. O ambiente comum, entre Deus e homem, é o ser impessoal do universo. Os princípios do bem e do mal, se viessem de Deus, seriam apenas a opinião de um ser que não é o ser ulterior. Mas se ele não fosse o ser ulterior, porque a opinião dele deve ser o referencial final? Porque não a opinião de um outro ser que também não é derradeiro? A ética em tal sistema seria relativa. Como é que uma ética última e absoluta, como nós encontramos na Bíblia, pode ser derivada de um ser que não é o ser última?
Finalmente, um Deus, como o de Pinnock, que não conhece o futuro, também não pode evitar a possibilidade de uma derrota futura nas mãos de um ser agora desconhecido que seja mais poderoso. Um ser finito não tem como garantir que ele é a força maior no universo. Para onde vão, então, as promessas de Deus e a confiança do cristão na sua salvação? Em qual sentido é isso superior à situação no qual os mórmons se encontram?
Em cada instância, a apologética reformada tem as únicas respostas a essas dificuldades. A apologética reformada começa a partir do Deus soberano, absoluto e último da teologia reformada como é ensinada na Bíblia. Desde que ele tem todo conhecimento e poder sobre a criação, ele não sofre das limitações que enfraquecem a teologia arminana e a teologia dos mórmons. Assim, o crente pode confiar que há uma solução ao problema do mal e que Deus nunca será derrotado por outras forças no universo. O crente calvinista tem boas novas de verdade para o mórmon que está procurando um Deus maior que pode lhe dá esperança e segurança. Agradecemos ao Deus verdadeiro que o "deus" dos mórmons não existe e que o Deus verdadeiro não é como tentam afirmar os arminianos.
 Por Allan Myatt.
______________________
- O autor é Bacharel em Artes (Psicologia e História) pela Vanderbilt University; Mestre em Divindade pelo Denver Seminary e Ph.D. em Estudos Teológicos e Religiosos pela University of Denver/ Iliff School of Theology em Denver, Colorado. Professor de teologia na Faculdade Teológica Batista de São Paulo desde 2001, tendo lecionado a mesma matéria no Seminário Teológico Batista do Sul do Brasil no Rio de Janeiro (1996-2001). Também atuou como professor visitante na área de Filosofia da Religião no Centro Presbiteriano de Pós-Graduação Andrew Jumper, na Universidade Presbiteriana Mackenzie, São Paulo. Desde 1995 é missionário no Brasil pela International Mission Board of the Southern Baptist Convention, E.U.A.
NOTAS
(1) Martinho Lutero. Da Vontade Cativa. em Martinho Lutero: obras selecionados, Vol. 4: Debates e Controvérsias, II. Trad. por Luis H. Dreher, Luis M. Sander, e Ilson Kayes, Comissão Interluterana de Literatura, org. (São Leopoldo: Editora Sinodal e Porta Alegre: Concórdia Editora, 1993), XV:215.
(2) Clark Pinnock, Grace Unlimited (Minneapolis: Bethany Fellowship, 1975), 98. Veja também o capítulo de Pinnock em Predestinação e Livre Arbítrio. David Basinger e Randall Basinger, orgs., (São Paulo: Mundo Cristão, 1989).
(3) John E. Sanders, "God as Personal", em The Grace of God and the Will of Man, Clark Pinnock, org. (Grand Rapids: Zondervan, 1989), 176.
(4) Pinnock, Grace Unlimited, 101.
(5) Veja The Openness of God (Downers Grove: Inter Varsity Press, 1994). Neste livro Pinnock e outras fazem uma nova definição de Deus que nega ousadamente a presciência de Deus de todos os eventos do futuro.
(6) Soberania Banida: redenção para a cultura pós-moderna (SP: Editora Cultura Cristã, 1998).
(7) João Calvino, As Institutas da Religião Cristã, I.xvi.2.
(8) Ibid. , I.xvi.3.
(9) Ibid. , I.xvi.4.
(10) Ibid., I.xvi.6.
(11) Ibid., I.xvi.8.
(12) Veja a Confissão de Westminster capítulo 5.
(13) Reasoning from the Scriptures (Brooklyn: Watchtower Bible and Tract Society, 1985), 142.
(14) Ibid., 139.
(15) Ibid., 141.
(16) Aid to Bible Understanding (Brooklyn: Watchtower Bible and Tract Society, 1971), 596.
(17) Ibid.
(18) Albert Pike, Morals and Dogma: ancient and accepted rite (Washington, DC: House of the Temple, 1950), 102.
(19) Sun Myung Moon (The Divine Principle, New York: Unification Church, 1973), 55.
(20) L. Ron Hubbard, Dianetics (Los Angeles: American Saint Hill, 1950), 229.
(21) Holmes, Science of Mind (New York: Dodd, Meade and Company, 1963), 109.
(22) Ibid.
(23) LeGrand Richards, A Marvelous Work and a Wonder (Salt Lake City: Deseret Books, 1953), 340.
(24) Bruce McConkie, Mormon Doctrine (Salt Lake City: Bookcraft, 1966), 26.
(25) Ibid.
(26) Ibid., 28.
(27) Joseph Smith, "King Follet Discourse", History of the Church: period 1. Vol. 6. (Salt Lake City: Deseret Books), 305.
(28) Sterling McMurrin, The Theological Foundations of the Mormon Religion, Salt Lake City: University of Utah Press, 1965., 29.
(29) Ibid.
(30) Ibid., 2.
(31) Ibid., 2-3.
(32) Ibid., 39.
(33) O problema do Um e o Múltiplo é um dos problemas principais da filosofia que cada cosmovisão tem de resolver. O problema surge no pensamento não-cristão logo no início porque o Deus Trino não é a base da cosmovisão nãocristão. O leitor encontrará uma discussão do problema em Norman Geisler e Paul Feinberg, Introdução à Filosofia: uma perspectiva cristã (São Paulo: Edições Vida Nova, 1983). Infelizmente, o tomismo de Geisler impede que ele resolva corretamente o problema. O Um e o Múltiplo, e também a Grande Cadeia do Ser são tratados, a partir de uma perspectiva reformada, por R. K. McGregor Wright em Soberania Banida, capítulo quatro.
(34) McMurrin, The Theological Foundations of the Mormon Religion , 49-50.
(35) Ibid., 99.
(36) Ibid., 108.
(37) Ibid., 97-98.
(38) McMurrin, The Theological Foundations of the Mormon Religion, 66-67, 71-72.
(39) Ibid., 77-78, 81.
(40) Cornelius Van Til, The Defense of the Faith (2nd ed. Phillipsburg, NJ: Presbyterian and Reformed Publishing Co., 1967), 11.
(41) Ibid., 12.
(42) Ibid., 13.
(43) McMurrin, 106-107.
(44) Gordon H. Clark, Religion, Reason, and Revelation (Nutley, NJ: The Craig Press, 1978), 232-233.
Fonte: mensagem de correio eletrônico.
Extraído do site: [ Militar Cristão ]
.